Colecções
No sábado passado, a Maria José depositou nas minhas mãos ávidas as pequenas moedas de 1 e 2 cêntimos gregos que há muito ambicionava. Terminei assim a minha colecção, atingindo o objectivo que me tinha proposto: obter um exemplar de cada uma das moedas em circulação na Zona Euro.
Tudo começou no dia 17 de Dezembro de 2001, quando dei por mim a perder uma hora e meia na fila de uma agência bancária, para comprar um kit das polémicas moedas que entrariam em circulação no dia 1 de Janeiro seguinte. Traziam ainda um cheirinho a futuro e um brilho de brinquedo novo que faziam olhá-las com desconfiança. E aquele insuportável ar global, que as incompatibilizava com os porta-moedas nacionais.
As primeiras a cruzar a fronteira foram rejeitadas nas bombas de gasolina de Badajoz. Depois, por entre os trocos dos cafés e das máquinas de venda automática, começaram a surgir, sorrateiramente, reis espanhóis e belgas, marianas francesas, arquiduques luxemburgueses, rainhas holandesas, monumentos e figuras célebres algures. Em pouco tempo, comercializavam-se já classificadores para moedas e bastava um indício de nacionalidade estrangeira para, pela Europa fora, alguém propor uma qualquer troca.
Os coleccionadores têm vindo a refinar-se: conheço quem classifique as moedas por ano e local de cunhagem. Eu nunca quis ir tão longe: uma de cada já equivale a tirar de circulação 46,56 euros, o que, no meu raciocínio, ainda é para cima de 9 contos de reis.
Há tempos, alguém me perguntava o que leva uma pessoa a fazer uma colecção, o que está por trás do espírito coleccionista e o que é que pode ser coleccionado. Virtualmente tudo - basta que haja dois objectos suficientemente parecidos e simultaneamente diferentes, na posse de alguém com um espírito lógico-matemático para aí ver uma série. Depois é só procurar um terceiro, e por aí fora. Isto é óbvio para quem cresceu numa família da qual três quartos coleccionavam qualquer coisa (ou muitas coisas): selos, moedas e notas antigas, latas de bebidas, maços de cigarros, calendários, pacotes de açúcar, pratas de chocolate, bonecas, carrinhos Matchbox, caixas e carteiras de fósforos, revistas, brindes de Bolo-rei, cromos de futebol e de desenhos animados televisivos, jornais, receitas de culinária, berlindes, esferográficas, autocolantes, livros, postais ilustrados, Pirilampos Mágicos, souvenirs de viagens, capicuas, bilhetes de cinema, caricas e o que mais viesse à mão.
Não há nada mais deprimente do que dar uma colecção por terminada. Esforcei-me por fazer render a minha colecção de euros o mais que pude. Imprimi uma tabela com as 96 casas necessárias, onde anotei, religiosamente, a data e a proveniência de cada uma das moedas que me chegavam às mãos. Consegui escapar a todo o tipo de propostas indecentemente facilitadoras - só fui forçada a cair na ratoeira que os finlandeses criaram, ao retirarem de circulação as moedas de 1, 2 e 5 cêntimos, que enriqueceram muito boa gente, que as vendia a 1 euro o kit, em lojas de câmbio. Mas, pelo menos, foi em Helsínquia. Em Lisboa, até virava a cara para o lado, ao passar pelas lojas de coleccionismo da Rua do Carmo e da 1º de Dezembro.
Agora, sinto-me um bocadinho desasada. Não fosse o misto de curiosidade e desejo que me despertam as cunhagens do Mónaco, de São Marino e do Vaticano e as edições comemorativas das moedas de 2 euros de alguns países, e nem precisava que a Wikipedia me acenasse com as efígies propostas pelos países do alargamento para afiar o dente.