Vira Virou

Vou voltar na Primavera
e era tudo o que eu queria
levo terra nova daqui
quero ver o passaredo
pelos portos de Lisboa
voa, voa
e eu chego já
ai se alguém segura o leme
desta nave incandescente
que incendeia a minha vida
que era viajante lenta
tão faminta de alegria
hoje é porto de partida
ah vira virou
meu coração navegador
ah gira girou
esta galera

Kleiton Ramil



Interpretação de Eugénia Melo e Castro, Terra de mel, Polygram, 1982.
Também no LP de Kleiton & Kledir, Kleiton & Kledir, Ariola, 1980.
Desenho de Luís Louro, Alice, Porto, Edições Asa, 1995, p. 21.

Le Port de la Lune

Quando, todos os anos, recebo os estudantes estrangeiros que vêm assistir às minhas aulas de Língua Portuguesa, ou quando chegam notícias dos meus alunos portugueses nas universidades europeias, não consigo deixar de recordar a minha própria experiência como estudante ERASMUS, entre Janeiro e Abril de 1990, em Bordéus.
Foi uma experiência muito marcante e muito enriquecedora. Lembro-me da dificuldade que tive em reter as lágrimas, quando, no final de Abril, senti o comboio arrancar da Gare St Jean, rumo a Portugal (o velho Sud Express, dos emigrantes e dos estudantes com pouco dinheiro).
Foram tempos memoráveis, de independência, socialização e responsabilidade (às vezes, falta dela: na verdade, baixei a média de licenciatura...).
Lembro-me das festas em casa da Claire, do Gabriel e do Bonus, que se estendiam noite dentro, a comer, a beber e a dançar furiosamente, e que só acabavam quando os vizinhos chamavam a polícia. E da festa de despedida das estudantes brasileiras, a Daniela, a Lúcia, a Heloísa e a Maruska, e das bebedeiras monumentais com a caipiroska.
Lembro-me dos serões passados com o Carlos no T0 do Geraldo (os Três Mosqueteiros...), a ouvir Zeca Afonso, Almir Sater e Serge Gainsbourg e a saborear os chás fabulosos do Comptoir Français du Thé (e das insónias subsequentes).
Lembro-me dos jantares de fim-de-semana no Sangria, o restaurante português do bairro de St Michel, o mais barato que conseguíamos arranjar.
E o comércio da rue Sainte Catherine; o Dub Styll, a loja de reggae da Pauline; a livraria Mollat, um mundo de perdição; os filmes de culto no Jean Vigo, e a experiência radical que foi ver o Blade Runner dobrado em francês; os momentos de leitura no Jardin Public; o jazz ao vivo no Le Bœuf sur le Toit; o L'Alligator, o Chez Auguste e o Bar de la Victoire, sempre, o nosso ponto de encontro no final do dia, onde nos aquecíamos com aquela mistela infecta, que parece água de lavar chávenas, a que os franceses chamam café. Nos dias de festa, um Ricard («sinon rien», como dizia o anúncio), ou uma cerveja belga trapista, ou «un demi Adel» (Adelscott, claro).
A homogeneidade arquitectónica da cidade, reconstruída no século XVIII pelos ingleses, que exploraram durante muito tempo a produção vinícola. A geminação com a cidade do Porto compreendia-se até pela acesa polémica de então sobre a construção de uma rede de metro (e pela posterior opção por um metro de superfície).
Os monumentos: o pont de Pierre, a porte Cailhau e o Pey-Berland, a flecha da catedral gótica de Saint André, eram os meus preferidos. A Esplanade des Quinconces surpreendia-me pela vasta superfície intocada pela especulação imobiliária.
O bairro moderno de Mériadeck, com o centro comercial que fechava aos domingos. E a indignação dos franceses quando eu sugeri que, à falta de melhor, os centros comerciais são óptimos locais para ocupar um domingo de chuva: «Então e os empregados das lojas, não têm direito a um dia de descanso?!». E a revolta ainda presente em algumas pessoas pela decisão do Chaban-Delmas, o eterno Presidente da Câmara (de 1947 a 1995), de arrasar todo um bairro antigo para construir aqueles enormes blocos de escritórios. E o medo de que isso se repetisse noutras zonas da cidade.
Os graffiti portugueses nas paredes dos bairros periféricos, e as vozes anónimas: «Michel, anda já para casa!».
E a universidade, claro: enorme, com várias faculdades e uma população estudantil muito numerosa que dava vida à cidade, que ficava deserta aos fins-de-semana.
As aulas de Literatura Medieval de Mme. Notz; a Lexicologia de M. Cocula, com os seus exemplos do francês popular («Comme dirait ma cremière…»); a mitocrítica de M. Dubois; a carne crua da cantina; o temporal que me apanhou mesmo a meio do imenso relvado que separa a Faculdade de Letras da Faculdade de Direito, e que quase me levou pelos ares.
O cheque de 1400 ECUs, o nosso quase exclusivo pecúlio ao desembarcarmos em Bordéus. E a ingenuidade de quem não sabia que, sendo o ECU uma moeda virtual (o antecessor do EURO), o reembolso do cheque demoraria, em qualquer instituição bancária, nunca menos de 15 dias... Não fosse o empréstimo concedido pela contabilidade da Faculdade, até fome teríamos passado.
Lembro-me do embate linguístico de quem estudava francês há 12 anos e que, nas palavras da Claire, «falava como nos livros». Escusado será dizer que essa constatação deu origem a uma sessão de ensino intensivo de calão. E lembro-me da minha alegria quando reparei que conseguia compreender integralmente as conversas dos estudantes que se amontoavam no autocarro F, que nos levava ao campus universitário. E da estranheza que foi aperceber-me de que já sonhava em francês.


A Faculdade de Letras

Ligações de interesse:
> Mairie de Bordeaux; Bordeaux Tourisme
> La CUB: Communauté Urbaine de Bordeaux
> Tram et Bus de la CUB: transportes urbanos
> Fac33: as escolhas dos estudantes para passar bem em Bordéus

Belfast Journal

Olá, Prof. Teresa!
Após prolongada ausência, finalmente regresso às minhas crónicas, agora com mais regularidade, prometo!
Durante a Teaching Practice, especialmente no início, andei sempre sob stress e, normalmente, como às 17h, 18h, quase todos os dias, costumo jogar futebol com os estudantes Erasmus, chegava sempre ao fim do dia muito cansado (e às vezes, meio lesionado!), e o facto de a sala dos pc's encerrar às 21h também é sempre um factor adverso para quem quer utilizar a Internet. Mesmo durante o fim-de-semana, só estão abertos até às 13h de Sábado e depois só reabrem na Segunda de manhã, o que me dificulta também com alguns trabalhos que tenho para fazer, pois, regra geral, o fim-de-semana é sempre quando temos mais tempo livre... E depois, existe a minha mãe... que, cada vez que me apanha no Messenger, nunca mais despega (-:
Quanto à Teaching Practice, para mim, já terminou e posso dizer que foi uma experiência muito enriquecedora. Entretanto, já se reiniciaram dois dos cursos que estamos a frequentar, sobre a Cultura Irlandesa, aspectos da sua sociedade e o papel da Irlanda na Europa. São mais duas semanas de 'lectures' e depois St. Mary's encerra para férias. Quanto ao nosso regresso às aulas, processar-se-á creio que a 18 de Abril e prolongar-se-á ainda por mais um mês. Vai ser durante este período que vou tentar conhecer algumas cidades da Grã-Bretanha e fazer publicidade ao nosso pequeno, mas encantador, rectângulo atlântico (apesar de não me pagarem para isso, sempre que posso, digo maravilhas de Portugal!!).
Ainda vou voltar à Escola nesta Quarta-feira, devidamente vestido de verde, pois a Professora com quem estive a trabalhar disse-me para lá voltar e assistir ao que eles têm preparado durante o dia. Os miúdos também vão todos vestidos de verde e deve ser engraçado assistir ao que vão fazer. Já tenho 3 cd's com fotos e filmes e vou aproveitar a ocasião para tirar mais umas quantas fotos... já passei das mil desde que cheguei!!!
A Ana foi Segunda-feira e hoje também ainda para a Escola, pois, como faltou dois dias, está a repô-los. Já não precisava de ir, mas a Ana fez questão de ir, e hoje é o dia da First Confession dos miúdos da sala dela e foi toda janota para a Escola!! Pelo que pude constatar, é sempre tema de muitas conversas na Sala dos Professores e é de muita importância para eles, querem que esteja tudo perfeito para a cerimónia. Pelo que tenho observado, a religião é um tema omnipresente nas salas de aula da Escola onde estivemos (e recordo que se trata de uma Escola Pública), tal como as normas e regras estabelecidas, às quais é impossível fugir.
Acho muita graça aos uniformes escolares daqui: quando os alunos saem das respectivas escolas, é sempre possível saber a que escola pertencem, pois cada escola usa uniformes diferentes.
Sobre o futuro próximo, esta quinta-feira, dia 17 de Março, é o dia de St. Patrick e feriado nacional, pelo que vou, juntamente com muitos dos estudantes do programa Erasmus, até Dublin, assistir às celebrações de St. Patrick e ao desfile, que, pelo que me dizem e já tive a oportunidade de assistir na televisão, é sempre muito colorido e é, certamente, o dia de maior significado para eles durante o ano... algo como o Carnaval para os brasileiros, mas com conotações religiosas. Tenho tido oportunidade de aprofundar os meus conhecimentos sobre a cultura irlandesa e o seu povo, e as celebrações do 17 de Março em Dublin constituem uma excelente oportunidade para os aumentar um pouco mais... tal como a minha colecção de fotos!! Quanto à Ana, preferiu não ir, pois tem voo marcado hoje para Londres.
Entretanto, nas próximas crónicas, que vou tentar escrever nos próximos dias, vou ver se falo dos sítios já visitados que ainda não mencionei e actualizar sobre o que entretanto vai decorrendo.
Saudações Irlandesas,
Pedro Bicho



> Esta e outras fotos no site oficial: St. Patrick's Festival 2005.

Feijoada completa

Mulher
Você vai gostar
Tô levando uns amigos pra conversar
Eles vão com uma fome que nem me contem
Eles vão com uma sede de anteontem
Salta cerveja estupidamente gelada prum batalhão
E vamos botar água no feijão

Mulher
Não vá se afobar
Não tem que pôr a mesa, nem dá lugar
Ponha os pratos no chão, e o chão tá posto
E prepare as lingüiças pro tiragosto
Uca, açúcar, cumbuca de gelo, limão
E vamos botar água no feijão

Mulher
Você vai fritar
Um montão de torresmo pra acompanhar
Arroz branco, farofa e a malagueta
A laranja-bahia, ou da seleta
Joga o paio, carne seca, toucinho no caldeirão
E vamos botar água no feijão

Mulher
Depois de salgar
Faça um bom refogado, que é pra engrossar
Aproveite a gordura da frigideira
Pra melhor temperar a couve mineira
Diz que tá dura, pendura a fatura no nosso irmão
E vamos botar água no feijão

Chico Buarque, Chico Buarque, Polygram, 1978.


A feijoada da Janete (detalhe)

Lembranças do Rio de Janeiro (I)

Lembro-me de ter comido muito bem no Rio de Janeiro.
Na primeira noite, depois de uma viagem enorme e dos contratempos na alfândega, por causa do extravio da bagagem, a Janete, que foi uma anfitriã incansável, levou-nos a uma esplanada no Arpoador (entre Copacabana e Ipanema), onde escolhi, como é meu costume, a iguaria com o nome mais esquisito. No caso, uma casquinha de siri regada com um belo chope. A casquinha de siri consistia numa vieira com creme de marisco gratinado; o chope, era chopp, uma cerveja mais leve, omnipresente no quotidiano carioca.


Bases para copos

Inesquecível foi a feijoada que a Janete e a Maria nos prepararam, dias depois, com tudo aquilo a que tinha direito, como na canção do Chico!
Foi também nessa época que tomei contacto, pela primeira vez, com os self-services brasileiros de comida a peso, agora tão comuns em Portugal. Uma péssima opção para quem tem mais olhos que barriga. Lembro-me que, enquanto os meus colegas compunham pratos de 6 reais, eu pagava 12 pela minha gula (e ficava doente o resto do dia...). Recordo, com água na boca, um self-service no Leblon, muito grande, com uma escolha muito variada e excepcionalmente boa.
E uma grande quantidade de sabores novos: a goiaba comprada aos vendedores de rua; o suco de jaca num boteco; o milho verde à saída da praia; o mamão, o abacaxi e a manga rosa servidos ao pequeno-almoço, com sabor a fruta madura, e não a contentores frigoríficos de transporte transcontinental; os docinhos baianos vendidos no pier da Barra; a caipirinha saboreada num quiosque da praia, no final de uma caminhada pelo calçadão de Copacabana (cerca de 4 km, do Arpoador ao Leme); o quiabo, de que não consegui gostar; e o suco de caju, horrível. Toda a minha vida pensei no caju como uma castanha deliciosa, que se come salgadinha, como aperitivo. Nunca me tinha passado pela cabeça que pudesse ter acoplado um fruto vermelho, de odor infecto, e que dele se pudesse extrair um sumo acre, extremamente desagradável, mas, ao que consta, de grande valor nutritivo.
A água de coco, que nas telenovelas parece deliciosa, é, sobretudo, fresca, mas não tem grande sabor (a coco não sabe, pelo menos). Mas é divertido andar com um coco verde na mão, a sorver por uma palhinha.


Praia do Leme

Os patrícios no Rio

Uma das coisas que mais me marcaram na minha passagem pelo Rio de Janeiro foi a familiaridade linguística, ter atravessado o oceano e passear pelas ruas como se estivesse em casa. Sabia que estava no estrangeiro e, ao mesmo tempo, tudo à minha volta me era próximo: letreiros, tabuletas, rótulos, imprensa, tudo era compreensível sem esforço, éramos irmãos. Até abrirmos a boca. Lembro-me de um motorista de táxi que, tendo-nos ouvido falar entre nós, nos perguntou: «Então, onde é que os patrícios querem ir?». Era difícil escapar às piadas do português.
Achei os cariocas muito simpáticos e abertos, mas um perigo ao volante. Como a minha grande amiga Janete nos explicou, o peão nunca deve ser demasiado confiante, uma passadeira ou um semáforo são elementos decorativos no tráfego carioca. Lembro-me de a Otília ter querido fazer valer os seus direitos numa zebra da Rua Francisco Otaviano e ter ficado encurralada, no meio da estrada, entre duas faixas de automóveis que não pararam.


Praia de Ipanema

Fotos em Belfast (III)


Falls Park. A 15 minutos da nossa casa, é onde se pode fazer jogging.

Belfast Castle.

Casas típicas na Victoria St.

City Hall (lá dentro tem pinturas, exposições de todos os tipos).

Este encantador tocador de gaita estava na esquina da City Hall, por acaso! Bela foto, humm?!?

Grand Opera House.

The Crown Pub.

Onde um pai de duas crianças foi esfaqueado, para proteger um amigo. No dia 7 de Fevereiro. Deixou mulher, dois filhos e muitos amigos...

Black Taxis. Black???
Fotos e comentários de Ana "Péu"