Romance de Cnossos

Entrada norte do Palácio de Cnossos, Creta

Este canto rouco rouco
das cigarras de Cnossos
Ouvi-o logo no porto
depois nos caminhos tortos
que sobem do porto ao ponto
onde ressurge Cnossos
Mais tarde à beira de um poço
Por fim diante dos cornos
destes inúmeros touros
que há no palácio minóico
Posso fingir que não o ouço
mas atravessa-me os ossos
alastra por todo o corpo
até me escalda nos olhos
este canto rouco rouco
das cigarras de Cnossos
Quando num último sopro
souber que não mais acordo
e tudo estiver em torno
imerso no mesmo ópio
decerto ouvirei de novo
no sono dos outros mortos
este canto rouco rouco
das cigarras de Cnossos
Contudo na manhã de hoje
nem só com isso me importo
Pior é sentir que o fogo
lateja sob este solo
Todo este calor de forno
não sei já como o suporto
Parece haver um acordo
feito entre o solo e o Sol
E terem ambos proposto
como língua de seus votos
este canto rouco rouco
das cigarras de Cnossos
Mas se o palácio percorro
eis que sofro de outro modo
Ver que o palácio é dos outros
mas que o labirinto é nosso
Que alimentamos o monstro
com o sangue de nós próprios
Que lhe damos o contorno
da sombra do nosso ódio
Que lhe buscamos no dorso
os nossos próprios remorsos
E de tudo isto em coro
nos vai verrumando os poros
este canto rouco rouco
das cigarras de Cnossos
Ó Grande Sala do Trono
dos tronos o mais remoto
onde Minos no seu posto
julgará todos os homens
Não de assassínios nem roubos
Só do que entregam à morte
E uns colocados no topo
outros no fundo dos fossos
vai repercutir-se em todos
vibrando de pólo a pólo
este canto rouco rouco
das cigarras de Cnossos

David Mourão-Ferreira
in As Lições do Fogo, Lisboa, D. Quixote, 1976, pp. 68-70.

Uma sala do Palácio de Cnossos, Creta

O lugar da História

Não visitei muitas ilhas gregas, muito turísticas, muito apetecíveis, mas posso gabar-me de ter ficado a conhecer razoavelmente bem a Grécia continental.

Santuário de Poseidon, Sounion, Ática

Lembrei-me, frequentemente, de ter ouvido os meus professores de História dizerem que o que levou os antigos gregos a viajarem e a dedicarem-se ao comércio e à navegação foi o facto de terem um país montanhoso, com solos pobres (em certa medida, o mesmo que se passou com os portugueses). De facto, a Grécia é um país com uma geografia muito acidentada, com paisagens deslumbrantes, sobretudo por ser fácil vislumbrar o mar de quase qualquer ponto do seu território. Mar e ilhas, que são imensas.
A minha amiga Marisa, que, curiosamente, me precede na maior parte das viagens, avisou-me: «Primeira paragem: estádio olímpico: tiras fotografias. Segunda paragem: estádio olímpico: tiras fotografias. Terceira paragem: estádio olímpico: já nem te dás ao trabalho. Chegas a um ponto que deitas estádios olímpicos pelos olhos!». Efectivamente, o que provoca o primeiro impacto e o que cansa mais depressa são os vestígios arqueológicos, que os há, literalmente, por todo o lado, uns mais bonitos, mais bem preservados e menos pilhados que outros. Incontornáveis (justamente classificados como património da humanidade), a Acrópole de Atenas, o santuário de Delfos, o teatro de Epidauro, a cidade de Micenas. Todos reconstruídos como construções Lego. O teatro de Epidauro impressiona pela paisagem magnífica e pelo facto de ainda se encontrar vivo e em funcionamento. Delfos, pela vista deslumbrante sobre o Mar das Oliveiras (um imenso olival). Já Cnossos, em Creta, é conhecido como a Disneylândia dos arqueólogos.

Meteora

Impressionantes, todos estes vestígios do passado. Mas o que mais me marcou foi a convivência de diferentes culturas e, em particular, o meu primeiro contacto com a arte bizantina e com a religião ortodoxa. Só Tessalónica conta com cerca de uma centena de igrejas e basílicas (património da humanidade), mas o mais fenomenal é o complexo de Meteora: cerca de 20 mosteiros medievais (6 ainda em funcionamento) encarrapitados em cima de umas formações geológicas estranhíssimas, que se assemelham a imensas estalagmites no meio da planície da Tessália. Belíssimo, também, o mosteiro de Osios Loukas, a cerca de 150 Km de Atenas.

Osios Loukas

Mas os traços da História, na Grécia, não se ficam por aqui: além das civilizações pré-helénicas, helénica, romana, bizantina, por lá passaram e deixaram marcas os turcos, os cruzados, os venezianos, os ingleses (bom, estes não deixaram marcas, levaram-nas com eles...) e por aí fora. Como resultado, um país jovem (a independência foi conseguida em 1828, depois de séculos de invasões e domínio estrangeiro), produto de múltiplas influências culturais, que, juntamente com a situação geográfica privilegiada, o Sol e o Mediterrâneo, o tornam um dos destinos turísticos mais procurados da Europa.

Fortaleza veneziana, Eraklion, Creta

O império dos sentidos

Há tempos, encontrei no Turista Acidental um belíssimo texto sobre Marraquexe que me trouxe recordações de umas férias, em 1992.
Marraquexe encanta, sobretudo, pela profusão de sensações que nos desperta: o calor, os odores, a quantidade gritante de cores, formas e texturas, o movimento que nos envolve e nos arrasta. É muito diferente da Europa, com uma oferta quase exclusivamente visual. E fica aqui tão perto…

Jamaâ El Fna

Impressões:
> a tonalidade vermelha das casas e da terra;
> a medina labiríntica (património da humanidade), com os seus souks ou mercados divididos em profissões pelas diferentes ruas: o souk das especiarias, o dos tintureiros, o dos tapetes, o dos cobres e latões...
> a praça central, Jamaâ El Fna, onde, durante o dia, se foge do calor e que, ao cair da tarde, se enche de vendedores, clientes e turistas, num enorme mercado que dura até ao fecho das portas da cidade, pela meia-noite. No interior de uma cintura de carros de vendedores de sumo de laranja, podemos encontrar de tudo um pouco: vendedores de água, com os seus trajes típicos, amestradores de macacos, encantadores de serpentes, engolidores de fogo, vendedores de tudo e mais alguma coisa, sempre prontos a regatear, em frente a um aromático chá de menta;
> os minaretes, com os seus chamamentos cantados. O da Koutoubia (século XI), no centro, é o maior e o mais imponente (quase 70 metros);
> a beleza delicada dos mosaicos que adornam os túmulos Saadianos, criados, no século XVI, pelo sultão Ahmed el Mansour, com a finalidade de albergarem os seus restos mortais e os dos seus sucessores;
> as indicações, nas ruas em torno das mesquitas: «Interdito a não-muçulmanos», que reflectem o orgulho na preservação das tradições («Os tunisinos são uns vendidos»);
> a frescura do lago artificial e dos jardins da Menara, na periferia;
> a pobreza gritante, patente na grande quantidade de homens em idade activa que se ofereciam, em frente aos hotéis, como guias para turistas, cobrando, à época, 1 dirham diário (cerca de 0,60 euros). Ou nas condições de vida e de trabalho dos curtidores de peles. Ou na ânsia generalizada de dar o salto para a Europa.

Um souk coberto

Ligações de interesse:
> Guias e informação variada: site oficial do Ministério da Comunicação de Marrocos, em inglês e em francês; I love Marrakesh; outro I love Marrakech; LexicOrient; Moroccan Gateway; Columbus Guides; Mini-guia Fodor's; Rough Guides; The Travel Room; Tourism in Morocco; World66
> Fotos

Menara

Uma tarde em Amesterdão

Se há coisa que me incomoda, é aterrar em cidades que não posso conhecer. Esta era a minha quarta escala em Amesterdão, com a aparente desvantagem de ser a mais longa (cerca de 5 horas e meia). Mas, numa tarde de sol, quando se comemoravam os 150 anos de Van Gogh, aquela conexão longa veio mesmo a calhar.
Apanhámos o comboio, que passa no subsolo do aeroporto, até ao centro da cidade, onde passámos uma tarde deliciosa, antes de retomarmos a viagem com destino a Lisboa.
Amesterdão, com o seu ritmo muito próprio, é um choque para quem vem da calma dos lagos finlandeses. Milhares de bicicletas a circularem freneticamente, automóveis que nos perseguem por todo o lado, hordas de turistas, tudo nos pareceu atentar contra a nossa integridade física.

Amesterdão

Gostei:
> do pulsar da cidade;
> da beleza dos canais e das pontes;
> da arquitectura muito típica;
> das ruas estreitas do Bairro da Luz Vermelha;
> do Museu Van Gogh, onde, além de obras do pintor, reencontrei velhos conhecidos (de exposições temporárias no CCB e em Serralves, agora na exposição Gogh Modern) e conheci novos interesses (por exemplo, duas obras de Kiefer que me impressionaram bastante).

Anselm Kiefer, Innenraum, 1981

Não gostei:
> do fraco apoio turístico prestado por quem tem consciência de que não precisa de cativar. No posto de turismo, tudo era pago: um simples mapa da cidade custava 2 euros.

Amesterdão

Ligações de interesse:
> Fotos: Preview Amsterdam; Panoramsterdam; Amsterdam Webcams; Grachten (canais); visitas virtuais
> Guias: Simply Amsterdam; Amsterdam Hotspots; Time Out; Let's go Amsterdam; Amsterdam.info
> Hotéis e reservas: Official Amsterdam Reservation Center; Book a Hotel in Amsterdam; Amsterdam Hotels Discount; Amsterdam hotel guide; Amsterdam Hotels Tours; Amsterdam Hotel Service
> mais ligações