Albufeira, Niagara Falls e Las Vegas

Ainda sobre Albufeira, convém frisar que todas as verdades absolutas têm o seu quê de relativo.
Dizia-me há dias a Anna, a minha aluna finlandesa, que Albufeira a tinha decepcionado bastante: esperava sol, praia e natureza, e em vez disso caiu em cheio num dos centros turísticos mais explorados de Portugal. «Parecia que estava em Las Vegas! Mas, pelo menos, quando fui a Las Vegas sabia ao que ia e com o que podia contar. Aqui, senti-me enganada».
Lembrei-me da impressão que tive, quando, em Agosto de 2001, fui conhecer as famigeradas cataratas do Niagara. Aproveito para fazer minhas as minhas próprias palavras e cito o relato que então fiz, por carta, ao Vítor:

«Este Verão, lá atravessei os Estados de Vermont e Nova Iorque na senda das famosas cataratas do Niagara. Um dos lugares mais bonitos do mundo, que regista o recorde mundial de venda de rolos fotográficos, e, ainda, um dos mais românticos, verdadeiro paraíso de lua-de-mel. Confirmei isso mesmo nas muitas fotos que encontrei nos diversos sites internéticos sobre turismo.
Chegámos já tarde, por volta das dez da noite. Lembro-me da primeira impressão, à chegada, e da minha exclamação: «This is freakin’ Las Vegas!» (trad. port. «Esta porra é mas é a Feira Popular!»). Nunca vi tanto local de diversão junto: ele eram casinos, casas de jogos, comboios fantasmas, casas do terror, museus do horror (não percebi a fixação temática, tão pouco conforme ao publicitado romantismo do local), Hard Rock Café, MacDonalds, Burger King (com um Frankenstein gigantesco em cima do telhado), pipocas, hot dogs, uma multiplicidade de lojas de souvenirs (alces, polícias montados, bandeiras canadianas, copos, chávenas, porta-chaves, mil e um itens com a imagem das ditas cataratas -- que sempre existiam, afinal). Tudo isto rodeado por uma cintura de restaurantes, hotéis, supermercados e outlet shoppings. O mais romântico que encontrei foi uma capela decorada a néon, que realizava casamentos instantâneos e oferecia serviço completo, limusina incluída. Limusinas era, de resto, o que mais se via por lá: as maiores parecia terem a capacidade de um T4. E serviam também para empatar o trânsito, que, por volta da meia-noite, era mais intenso que o tarantantam da Calçada de Carriche em hora de ponta.
Inenarrável. Tive de tirar uma fotografia, porque, como eu já esperava, o pessoal cá teve dificuldade em acreditar no meu relato. Só visto!



E as cataratas? Perguntas tu, com certeza, e perguntaram eles. Depois do jantar, lá fomos à procura das ditas, na esperança de as encontrarmos antes da meia-noite, hora a que desligam a iluminação nocturna (outra das atracções turísticas do local -- é assim tipo fonte luminosa colorida, ou fonte cibernética, como se diz agora). Demorámos bem uma hora para conseguir estacionar o carro e saímos a correr, na esperança de lá chegar antes da meia-noite. Nada feito: nós a chegarmos ao miradouro e as luzes a apagarem.
E as cataratas lá estavam, impávidas e imponentes, mais ainda na escuridão. Mil pés de largura por 162 pés de altura, a debitarem 40 milhões de galões de água por minuto, a acreditar na informação turística. E isto só a Ferradura canadiana, sem contarmos com as cataratas americanas, um largo véu de água e neblina. São uma força da natureza, uma coisa impressionante. Tudo isto do outro lado da estrada, ao alcance de uma zebra. Para cá, ficava o caos nocturno, a que as cataratas pareciam perfeitamente indiferentes, e as pessoas a elas.
De manhã, era o corrupio para o Maiden of the Mist, o barco (que são na realidade dois ou três) que faz o percurso junto às cataratas, e onde se gastam os tais rolos de fotografias (que, por sinal, há à venda por todo o lado). Milhares e milhares de pessoas amontoavam-se, primeiro, junto às bilheteiras, depois, de impermeável azul e máquina fotográfica em punho, no cais, como que à espera do cacilheiro.
Não nos apeteceu. Aquilo era missão para horas e horas de seca, a manhã ia alta e tínhamos ainda muito pó de estrada que comer. Deixámos as cataratas para trás, lindas, imponentes, indiferentes, e partimos, rumo a novas aventuras.»



Sim, Albufeira anda lá perto. E não vos falo aqui de Rodes, que a prosa já vai longa -- fica para uma próxima oportunidade. Aproveito só para deixar muitos, muitos beijinhos para os meus companheiros da saga norte-americana, a Ana, o Carlos e a Audrey.

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