Capela de São Frei Gil
Vouzela, Agosto de 2021
A Capela de São Frei Gil foi construída entre finais do século XVI e inícios do século XVII, mas teve a sua frontaria reedificada na segunda metade do século XVIII, em estilo D. João V: os cinco vãos incluídos na mesma moldura de cantaria rococó lembram um candelabro a iluminar o nicho central, onde a escultura calcária do orago exibe alguns dos atributos do seu poder taumatúrgico. A destacar, ainda, a beleza da talha dourada no interior e os pináculos em forma de urna nos cunhais da fachada, considerados exuberantes e de elevado valor escultural.
São Frei Gil foi um frade dominicano, médico, taumaturgo, teólogo e pregador português do século XIII, beatificado pelo papa Bento XIV a 9 de Maio de 1748. É um dos beatos portugueses com maior projecção nacional e internacional.
Nasceu Dom Gil Rodrigues de Valadares, no castelo de Vouzela, cerca de 1190, e faleceu em Santarém, no dia 14 de Maio de 1265, aí tendo sido sepultado. Era filho de Dom Rodrigo Pais de Valadares, alcaide-mor de Coimbra (então a capital do Reino), fidalgo do Conselho de el-Rei D. Sancho I e seu mordomo-mor.
Dom Gil recebeu, provavelmente, a sua educação religiosa e intelectual no Mosteiro de Santa Cruz, em Coimbra, a primeira escola de estudos superiores em Portugal, onde terá estudado filosofia e medicina, e doutorou-se posteriormente em Teologia na Universidade de Paris. Ao deixar a pátria, cerca de 1225, tinha já alguns benefícios e prebendas eclesiásticos e, talvez, a dignidade de presbítero. Regressou a Portugal, cerca de 1229, e foi designado prior provincial da sua Ordem para as Espanhas por duas vezes, em 1233 e em 1257.
Muito se escreveu sobre São Frei Gil, misturando-se, não poucas vezes, a realidade e a lenda. Almeida Garret, Eça de Queirós, Teófilo Braga, António Correia d'Oliveira, João Grave e outros, com mais ou menos fantasia literária, mais ou menos pormenores, todos envolveram a vida do santo numa atmosfera de maravilhoso sobrenatural e romanesco, a lembrar o Fausto, de Goethe. Em troca da sabedoria e da sua iniciação na magia negra, Gil teria vendido a alma ao diabo, num pacto que selara com o próprio sangue. Depois dos maiores desvarios, desiludido da ciência, renunciara ao mundo, amortalhando-se no seio dos frades dominicanos.
Os seus restos mortais foram colocados em humilde sepultura monástica, até que, seis anos mais tarde, D. Joana Dias, senhora de Atouguia, sua parente, custeou as despesas de um melhor túmulo numa das capelas do convento dominicano de Santarém. A sua sepultura tornou-se lugar de peregrinação ao longo dos séculos; por sua intercessão e pela virtude das suas relíquias acredita-se terem sido operadas graças singulares e milagres que bem cedo levaram o povo a venerá-lo como santo.
Depois da Guerra Civil portuguesa, em 1833, por ordem do então Governador-Civil de Santarém, Joaquim Augusto Burlamaqui Marecos, 1º barão e 1º visconde de Fonte Boa, seguindo instruções do novo Governo liberal, o convento dominicano de Santarém foi vendido e destruído ao desbarato, ali se tendo construído em seu lugar uma praça de toiros. Apenas alguns dos despojos arquitectónicos medievais foram salvos, encontrando-se actualmente reunidos em exposição ecléctica na capital do Ribatejo. Do túmulo de São Frei Gil apenas resta a tampa com a estátua jacente, transferida para o Museu Arqueológico, no Museu do Carmo, em Lisboa.
Na Capela, conserva-se e venera-se uma relíquia constituída pelo maxilar inferior do santo vouzelense. Foi a relíquia trazida para ali, em 1626, como pode ver-se por certidão dessa data, passada pelo prior do Convento de Santarém, na qual se diz que a cedência da relíquia foi pedida pelo Dr. António de Escovar de Tavares, que era corregedor de Santarém e natural de Vouzela, «daonde tambem o era o bemaventurado Padre sam frey Gil Religioso da Ordem do nosso Glorioso Patriarcha Sam Domingos, o qual esta sepultado neste Convento daonde foi Prelado».
São Frei Gil é o santo padroeiro da vila de Vouzela, sendo a sua festa antigamente celebrada a 14 de Maio. Hoje, depois da reforma litúrgica do Concílio Vaticano II, celebra-se a 15 do mesmo mês.
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