Memória futura (3)




Vila Viçosa, Janeiro de 2023

De entre os vários monumentos de homenagem existentes em Vila Viçosa, o que mais se destaca é, sem dúvida, a estátua equestre de D. João IV, erigida no âmbito das comemorações do centenário da Restauração e da Fundação da Casa de Bragança.
Em 1938, o ministro das Obras Públicas, Engenheiro Duarte Pacheco, confiou ao escultor Francisco Franco de Sousa a execução do modelo da estátua equestre, a erguer em 1940, e ao Arquitecto Porfírio Pardal Monteiro, na qualidade de assessor de Francisco Franco, o estudo da urbanização do terreiro e a elaboração do projecto do pedestal, ficando estes de apresentar o programa de conclusão dos estudos do projecto e o modelo da estátua até ao dia 15 de Outubro desse ano. Na verdade, o projecto acabou por se atrasar e o máximo que a Comissão Nacional dos Centenários conseguiu ter, em 1940, foram duas provas fotográficas da maquete, para a execução dos selos postais comemorativos, e uma cópia em gesso da estátua, que foi apresentada na Exposição do Mundo Português.





É um monumento imponente, com mais de seis metros de altura, uma obra "de grande dignidade na sua cuidada elaboração, síntese de bons exemplos bem unificados, velasquenha por necessidade e funcionando como se pretendia, e com escala suficiente, no vasto terreiro do Paço Ducal" (palavras de José-Augusto França, aqui). Está situado no centro do Terreiro do Paço, com o Paço Ducal atrás e rodeado pelo Convento das Chagas, o Paço dos Bispos e o solar dos Caminha.
Teve, porém, uma história atribulada. Segundo João Vieira Caldas, arquitecto e autor de um livro biográfico de Pardal Monteiro, começou aqui a ruptura entre o arquitecto e Duarte Pacheco, que determinou o seu afastamento prolongado de toda a encomenda pública, levando-o a aceitar a realização de projectos para vários prédios de rendimento em Lisboa. Ao que parece, Duarte Pacheco gostava de "comentar os desenhos que lhe eram apresentados riscando-os com o lápis, hábito que irritava profundamente Pardal Monteiro". Por isso, quando lhe mostrou os desenhos para o arranjo do Terreiro do Paço Ducal em Vila Viçosa, projecto datado de 1938/39, o arquitecto resolveu apresentá-los cobertos por um vidro. "Duarte Pacheco não disse nada na altura, nem voltaria a falar no assunto, mas a sua relação com Pardal Monteiro esfriou completamente e não voltou a chamá-lo para qualquer tipo de trabalho ou de conselho", conta Vieira Caldas. Mas o caso mais grave estava ainda por acontecer.

"Na manhã de 15 de Novembro de 1943, Duarte Pacheco foi a Vila Viçosa, inteirar-se dos trabalhos em curso para a construção da estátua de D. João IV, mas queria chegar a tempo ao Conselho de Ministros, marcado para a tarde. Ao regressar a Lisboa, na Estrada Nacional n.º 4, no lugar da Cova do Lagarto, entre Montemor-o-Novo e Vendas Novas, o veículo oficial seguia a alta velocidade e despistou-se, embatendo com o lado direito num sobreiro. Um acompanhante teve morte imediata. Os outros sofreram ferimentos relativamente ligeiros. Os de Duarte Pacheco foram graves. O ministro foi transportado para o Hospital da Misericórdia em Setúbal. Mal foi informado, Salazar seguiu para lá, fazendo-se acompanhar de um grupo de médicos reputados. De nada puderam valer e, na madrugada de 16, era confirmado o óbito de Duarte Pacheco, devido a uma hemorragia interna".
Três semanas depois, foi inaugurado o monumento, com pompa e circunstância, tendo sido gastos 20.000$00.
"Com a presença das mais altas individualidades do Estado Novo, é inaugurada, em Vila Viçosa, a 8 de dezembro de 1943, a estátua equestre de D. João IV, construída em bronze pela mão do escultor funchalense Francisco Franco.
O discurso oficial esteve a cargo do académico Júlio Dantas, escritor, médico, político e diplomata.
No Diário de Lisboa, publicado na tarde desse dia, é bem visível, na introdução que é feita a este acontecimento naquela vila alentejana, o pendor literário dos articulistas que, na época, redigiam as notícias nos diversos órgãos de informação:
«Vila Viçosa, pousada como uma grande pomba branca na planície que faz o sopé das vertentes da pequenina serra de Borba, envolvida de olivais, emoldurada de chaminés recortadas de casario alentejano, de torres de igrejas e de coruchéus de palácios, acordou hoje engalanada»."


No dia 9 de Outubro de 1954, a Fundação da Casa de Bragança solicitou ao município autorização para colocação, no sopé do monumento, de um florão de bronze, que o embaixador do Brasil iria oferecer, de dimensões semelhantes às do florão colocado no monumento de D. Pedro IV, em Lisboa, igualmente oferecido pelo Brasil.

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